PENSAMENTO ECONÔMICO HETERODOXO E A QUESTÃO DO DESENVOLVIMENTO: CONTRIBUIÇÕES PARA VALORIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
HETERODOX ECONOMIC THINKING AND THE PROBLEM OF DEVELOPMENT: CONTRIBUTIONS TO THE APPRECIATION OF FUNDAMENTAL RIGHTS
Matheus Fernando de Arruda e Silva*
Mirta Gladys Lerena Manzo de Misailidis**
RESUMO:O presente artigo faz uma abordagem exploratóriadainfluência do pensamento econômico heterodoxo e sua preocupação com o desenvolvimento no Brasil e demais países latino-americanos, relacionando-o a valorização de direitos fundamentais. Para tanto, foi abordado a contribuição da CEPAL, da teoria da dependência e da teoria do capitalismo tardio. Nosso principal intuito é contribuir no fomento da ciência jurídica em âmbito acadêmico por meio de diálogo transdisciplinar especialmente entre o Direito e a Economia. A metodologia utilizada foi a dialética em vertente jurídico-sociológica.
Palavras-chave:América Latina. Desenvolvimento. Direitos Fundamentais.
ABSTRACT:The present article makes an exploratory approachof the influence of the heterodox economic thinking and its concern with development in Brazil and other Latin American countries, relating it to the appreciation of fundamental rights. To that end, we discussed the ECLAC contribution, the theory of dependence and the theory of late capitalism. Our main objective is to contribute to the promotion of legal science in the academic sphere trough transdisciplinary dialogue, especially between Law and Economics.The methodology used was the dialectic in juridical-sociological aspect.
Keywords: Latin America. Development. Fundamental Rights.
Recebido: 14.05.2017
Aprovado: 11.06.2017
1 INTRODUÇÃO
Em economia podemos afirmar que existem duas principais vertentes, quais sejam a ortodoxa e a heterodoxa. A primeira representa o mainstream, e possui inspiração originariamenteinspirada nos autores clássicos liberais como Smith, Ricardo, Malthus, James Mill, McCulloch, Senir e John Stuart Mill (SILVA; MISAILIDIS, 2016, p. 139), e que posteriormente se desenvolve durante os anos 60 do século XX a partir das concepções de Muth, Phelps e Friedman, os quais dariam ensejo aos ideais neoliberais (SILVA; MISAILIDIS, 2016, p. 140).No Brasil, dentre os economistas de vertente ortodoxa, é possível mencionar Eugênio Gudin, Octávio Gouveia de Bulhões, Dênio Nogueira e Daniel Carvalho (SILVA, 2010, p. 8).
A vertente ortodoxa“se materializa na política de metas de inflação fundada no equilíbrio das ‘taxas naturais’ de emprego e produto, o que impede a intervenção pública sob o risco de quebrar a ‘credibilidade’ que compõe a natureza psicológica dos agentes” (SAWAYA, 2015, p. 108), de modo que “interferir nos mercados deixaria os agentes (trabalhadores, empresários e consumidores) confusos, sem saber se a variação nos preços é inflação ou sinal para ajustes necessários entre oferta e demanda” (SAWAYA, 2015, p. 110).
Ademais, menciona Silva (2010, p. 8) que:
A corrente ortodoxa neoliberal sintetiza uma vasta convergência de concepção, tanto no tocante ao axioma básico da eficiência dos instrumentos equilibradores do mercado e prioridade na estabilização da economia com equilíbrio das contas públicas, quanto à perseguição do crescimento econômico com alguma intervenção estatal saneadora de imperfeições de mercado.
Já a segunda possui originariamente influência das escolas marxistas, keynesiana, pós-keynesiana, dentre outras, e compreende autores como Karl Marx, John Maynard Keynes, dentre outros (SILVA; MISAILIDIS, 2016, p. 139-140). No Brasil, em especial, é notório a influência sobre a Escola de Campinas, em especial a Unicamp, e aqui podemos citar, em especial, João Manoel Cardoso de Mello, autor da teoria do capitalismo tardio, a qual abordaremos nesse trabalho.
Ao se compreender as escolas econômicas e suas formas de pensar, estamos compreendendo, em última análise, as motivações que norteiam as tomadas de decisão dos policymakers[1].
O debate sobre o pensamento econômico e o direito veio novamente a tona em decorrência do processo de impeachment da presidente democraticamente eleita Dilma Rousseff, cujo sucessor a título de presidente interino, Michel Temer, passou a adotar junto da nova equipe econômica medidas de caráter neoliberal, alinhados ao pensamento econômico ortodoxo.
O impeachment teve como principal objeto crime de responsabilidade fiscal. Esse crime, conforme entenderam o Legislativo, foi motivado pela emissão de créditos suplementares sem consulta prévia a ele, e também por atrasos de repasses a bancos públicos e para o FGTS - Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (CUNHA, 2016). Tais medidas constituíram as denominadas pedaladas fiscais, e teriam como propósito equilibrar as contas públicas e permitir os gastos do governo, em especial os de caráter social, como os programas Minha Casa Minha Vida, Bolsa Família, subsídios para juros das operações do Plano Safra, etc (CUNHA, 2016).
Por outras palavras, a motivação do impeachment foi de caráter financeiro, sob a alegação de que o Estado gastou demais e que, por conta disso, não era capaz de pagar seus próprios gastos. Esse tipo de discurso é típico dos defensores do posicionamento neoliberal, mainstream, de viés econômico ortodoxo, que aplica formulações de caráter microeconômico em âmbito macro. Nesse sentido, a presidente eleita representa, conforme aqueles que se posicionam em prol das reformas de natureza neoliberal, um modelo que levou o país à uma severa crise financeira. Aponta Sawaya que para os defensores da vertente ortodoxa “os gastos públicos ‘excessivos’ (sociais) teriam subvertido a ‘boa teoria’ fundada nas ‘leis da natureza’ e assim retirado o ‘mercado de trabalho’ de seu ‘equilíbrio natural’ e o crescimento do PIB de seu ‘potencial’” (SAWAYA, 2015, p. 106). Com isso “o foco do momento passou a ser criticar a Constituição de 1988 que teria ampliado em demasia os direitos sociais em relação à capacidade de gasto do Estado. O objetivo é gerar superávits primários para pagar juros elevados e não gastos sociais” (SAWAYA, 2015, p. 108). E qual seria a solução para os defensores de tal vertente? O saneamento das contas públicas. E como isso seria feito? Cortando os gastos tidos como desnecessários e estabelecendo um teto para os gastos públicos, o que, infelizmente, foi estabelecido por meio da Emenda à Constituição 95/2016que deverá estar sob vigência no ordenamento jurídico brasileiro por 20 anos.
Ademais, percebe-se que o governo do Presidente Michel Temer vem tentado promover a adoção de outras políticas de caráter neoliberal, a exemplo das reformas trabalhistas e da previdência, as quais fragilizam direitos fundamentais. A da previdência, em especial, segundo o atual Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, é fundamental por abocanhar mais de 40% dos gastos públicos (CUNHA, 2016). Por outras palavras, a solução que o Estado deve tomar, conforme apontam os defensores do ideário neoliberal, é suprimir direitos fundamentais. Em especial no caso da previdência, chega a ser perverso estipular ao trabalhador, em especial àqueles que dependem exclusivamente da previdência pública e não possuem nenhuma outra forma de auferir renda, trabalhar até os 65 anos de idade[2], porém aos 65 não estariam garantidos o texto máximo da aposentadoria.
Temos então um embate. De um lado os direitos fundamentais, os quais necessitam de uma prestação por parte do Estado, o que ocorre mediante gastos públicos. E do outro, está a real capacidade financeira do Estado em conseguir prover esses direitos. Assim, nos parece lógico afirmar que quanto maior a prestação desses direitos por parte do Estado maior deva ser sua capacidade de financiamento. E o que o Estado deve fazer para conseguir aumentar sua capacidade de financiamento? Ele deve crescer, auferindo níveis cada vez maiores, afim de com isso conseguir realizar a devida prestação dos direitos fundamentais. Ao crescer e conseguir prestar tais direitos, o que o Estado está fazendo é promover o desenvolvimento.
Mas, o que é desenvolvimento? Lyra e França apontam que “o termo desenvolvimento apresenta um abstratismo em seu significado, de critérios analíticos extremamente subjetivos” (LYRA; FRANÇA, 2011, p. 2) e que por isso, como norte, é “necessária uma interdisciplinaridade, eis que o termo pode ser estudado pela Economia, Sociologia, História, Direito, entre outros” (LYRA, FRANÇA, 2011, p. 2) sendo que, em virtude da relação estabelecida entre Economia e Direito, “o termo desenvolvimento sempre esteve atrelado ao crescimento econômico, ao progresso capitalista” (LYRA; FRANÇA, 2011, p. 2), embora, nos dias atuais, como bem apontam os autores, “não se pode fechar os olhos para as questões sociais, tais como a saúde, a educação, o saneamento básico. Enfim, não se pode ignorar o desenvolvimento como uma melhoria nas condições de vida das pessoas” (LYRA; FRANÇA, 2011, p. 2). Os direitos fundamentais visam justamente garantir melhorias nas condições de vida das pessoas, logo, garantir o desenvolvimento, passar a atuar enquanto espécie de sinônimo de prestação de direitos fundamentais por parte do Estado. Menciona-se ainda, para fins reflexivos, a concepção de justiça de John Rawls, segundo o qual “a justiça é a primeira virtude das instituições sociais” (RAWLS, 2000, p. 3) e, como tal, “leis e instituições, por mais eficientes e bem organizadas que sejam, devem ser reformadas ou abolidas se são injustas” (RAWLS, 2000, p. 4). A devida prestação dos direitos fundamentais, se torna, portanto, medida de justiça. Ocorre que o que foi abolido não foi um governo injusto pelo contrário, justamente por ser dotado de um viés desenvolvimentista é o que o mesmo se tornava justo.
Não concordamos com a lógica perversa que vem sendo adotada por um governo de legitimidade questionável, e como tal, nesse trabalho, pretendemos abordar a influência do pensamento econômico heterodoxo e sua preocupação com o desenvolvimento no Brasil e demais países latino-americanos, relacionando-o a valorização de direitos fundamentais.
Nosso principal intuito é contribuir com o fomento da ciência jurídica em âmbito acadêmico por meio de diálogo transdisciplinar especialmente entre o Direito e a Economia[3]. Para tanto, utilizamos a metodologia dialética em vertente jurídico-sociológica (GUSTIN; DIAS, 2002, p. 42 e ss). A pesquisa realizada foi de caráter bibliográfico, se valendo entre as principais fontes utilizadas de artigos e livros sobre a temática.
De modo a se atingir o objetivo proposto, este trabalho está dividido em três seções principais. Na primeira traçamos breves considerações sobre transformações relacionadas ao desenvolvimento na América Latina. Já na segunda realizamos uma abordagem de caráter teórico buscando descrever, especialmente por viés econômico, a influência do pensamento econômico heterodoxo na América Latina com ênfase especial no Brasil. Dentre os temas abordados incluem-se a influência da CEPAL e teorias econômicas que dela se inspiraram: teoria da dependência e teoria do capitalismo tardio. Por fim, na terceira buscamos estabelecer a relação desse pensamento com o direito, fundamentando o porquê de o pensamento econômico desenvolvimentista valorizar os direitos fundamentais.
2 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE TRANSFORMAÇÕES RELACIONADAS AO DESENVOLVIMENTO NA AMÉRICA LATINA
A partir do Século XIX, com a ruptura do pacto colonial, as novas elites políticas da antiga América Espanhola optaram por impor a seus povos os modelos de organização europeia e estadunidense (MAYER,1987,p.17). Assim, a visão histórica da América Latina pode ser considerada como a história da ocidentalização. São imensas as influências que europeus e norte-americanos exerceram, bem como ainda exercem, dado o processo de reprodução cultural na vida dos latino-americanos, redefinindo ou anulando a herança indígena e a africana e também a ibero-americana. Desta forma, a urbanização e a industrialização em quase todos os países da região se organizaramem torno dos centros produtivos, dos portos, das linhas de ferro e de alguns serviços públicos tais como, saúde e educação. Entretanto, junto ao desenvolvimento da estrutura produtiva se experimenta a dominação das oligarquias agrárias e das emergentes elitesindustriais. Da mesma forma, a urbanização e a imigração contribuíram para a transformação da estrutura ocupacional que perde progressivamente seu foco no setor agrário e se diversifica para mineração, a manufatura, a construção e serviços.
Não obstante, a crisedo Estado oligárquico outorga o acesso de novos grupos sociais à estrutura do poder e em particular às classes médias. E, nas lutas de deslocar à oligarquia, buscaram alianças com os movimentos sindicais nascentes a fim de obter mudanças eleitorais. Tais alianças permitiram modificar o equilíbrio de forças políticas e assentar as bases do que mais tarde se transformou no denominado Estado Populista (ZAPATA,1993,p.11).
Ademais, cabe salientar que, além dos fatores mencionados, as grandes mudanças na estrutura econômica de determinados países latino-americanos, como Argentina, Brasil, Chile eMéxico, os quais atingiram maior nível econômico no final do Século XIX e princípios do XX, se configurou pelo ingresso do capital estrangeiro na economia de exportação de zinco, estanho, algodão, petróleo, carne, trigo, açúcar e café. Segundo Francisco Zapata, a característica central desse período foi a existência de um setor exportador centrado na agricultura das fazendas e no mercado interno (ZAPATA, 1993,p.12). A fim de escoar esses produtos se constroem redes de transporte, como ferrovias, portos, e além disso foram criados serviços financeiros, bancários e comerciais para administração das relações econômicas que se estabelecem no âmbito do mercado internacional. Porém, essas novas estruturas contribuíram para o surgimento de uma sociedade em que a economia pertencente as oligarquiasrurais vão perdendo poder e o que ocorre na vida urbana passa a ser determinante na vida política e econômica dos anos 30 do Século XX.
Segundo Celso Furtado, o adventoda crise de 1929 e a progressiva recessão acabam com os mecanismos de defesa da economia colonial, o que promove as exportações da atividade das indústrias(FURTADO,1985,p.69).O autor ainda afirma que nesse período o Brasil não só encerrou seu ciclo colonial, como também se preparou para introduzir novas metodologias nas importações e exportações (relações de trocas), as quais, por sua vez, seriam adotadas nos estudos da CEPAL – Comissão Espacial para a América Latina e Caribe (FURTADO, 1985,p.70).Essaindustrialização constituiu o que mais tarde se denominariao desenvolvimento impulsionado pelas substituições das importações.
Devemos ainda ter em vista que a economia dos países da América Latina durante o século XX foi essencialmente cíclica, caracterizando-se por ondas de expansão seguidas de ondas de depressão, acompanhando necessariamente os ciclos da economia internacional devido a sua dependência com os países desenvolvidos. Nesse sentido, a expansãodecorre da Primeira Guerra Mundial e acaba com a crise de 1929, e prossegue com a Segunda Guerra Mundial e a Guerra da Coreia até o fim da década de cinquenta. Inobstante, a própria “década perdida”, como ficou popularmente conhecida no Brasil a década de 80, devido a situação de crise econômica que durou por toda a década e que só foi se amenizar pós advento do Plano Real em 1994, foi altamente prejudicada devido à subordinação e dependência com os mercados estrangeiros.
3 INFLUÊNCIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO HETERODOXO NO BRASIL E AMÉRICA LATINA SOBRE A QUESTÃO DO DESENVOLVIMENTO
No século XX, especialmente desde o primeiro governo Vargas, é possível observar que as políticas econômicas brasileiras se nortearam à questão da industrialização como meio de se atingir o desenvolvimento. A política de Vargas visava deixar para trás, ou ao menos tentar minimizar, o legado colonial exportador de matéria-prima, para se inserir no sistema internacional enquanto um país de centro industrializado e desenvolvido.
A crise de 29, símbolo do fracasso da acumulação do capital e da veneração à “mão-invisível” do ideário liberal, foi um marco na história do pensamento econômico. O modelo de acumulação sem limites foi posto em xeque pela primeira vez na história. O fenômeno conhecido como “A Grande Depressão”, ocorrida anos 30 como reflexo direto do crash[4] da bolsa de Nova Iorque, e a preocupação para que uma outra crise violenta como essa não viesse mais a ocorrer, foi uma das motivações de sir John Maynard Keynes para escrever a sua “Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda” (KEYNES, 1992).
A primeira Grande Guerra[5] (1914-1918), especialmente no que concerne a Alemanha, não fora inteiramente superada, de tal forma que é possível afirmar que a segunda Grande Guerra (1939-1945) seria uma espécie de continuação da primeira, já que dela resultam as condições necessárias que permitiram a ascensão do partido nazista e a articulação de acordos que permitiram Hitler chegar ao poder (Cf. HOBSBAWM, 2003). Para o direito, não obstante, é justamente do reconhecimento da segunda Grande Guerra como marco, que a sociedade internacional articulou diversos mecanismos para a tutela dos direitos internacionais dos direitos humanos[6]. Por sua vez, para o pensamento econômico, a questão do desenvolvimento não poderia mais ser posta em segundo plano.
Bastos e D’Ávilla (2009, p. 175) explicam que:
[...] as décadas de 1940 e 1950 marcam uma mudança na perspectiva intelectual até então dominante, com a emergência de um novo consenso, o “consenso do desenvolvimento”, que prevalecerá no cenário econômico e mundial até os anos 1970. Ilustrativa desse “consenso” foi a declaração por parte das Nações Unidas (ONU) e do governo dos Estados Unidos, da década de 1960 como a “década do desenvolvimento”. A adoção de políticas desenvolvimentistas recebeu o apoio explícito de órgãos internacionais oficiais e as Comissões Regionais da ONU assumiram um papel ativo no exame dos problemas do desenvolvimento [...].
O desenvolvimento passa a ser um vocábulo de especial importância para a sociedade internacional, preocupação essa que se refletiu inclusive dentro da ONU, que criou comissões regionais especializadas com essa questão. Dentre essas comissões regionais da ONU, uma é de especial interesse: Comissão Econômica para América Latina (CEPAL), criada em 1948. Essa comissão estabelece uma relação estreita com o pensamento de Raúl Prebisch[7], que entrou na instituição em 1949, e nela elabora o documento “O desenvolvimento econômico da América Latina e seus principais problemas”, o “Manifesto da CEPAL”, cujo enfoque são “as particularidades do desenvolvimento dos países da periferia do sistema mundial, especializados na produção de matérias-primas e alimentos”[8] (CEPAL, 2016).
Com relação as influências do pensamento latino-americano, e brasileiro em particular, mencionam Bastos e D’Ávilla (2009, p. 176) que:
O pensamento heterodoxo desenvolvimentista latino-americano em geral, e brasileiro em particular, nasce das ideias e do ambiente intelectual desenvolvimentista mundial dos anos 1940 e evolui com a incorporação de outras contribuições heterodoxas, principalmente de autores de alguma forma ligados à tradição de Cambridge, como Kalecki, Kaldor, Joan Robinson e outros, como Steindel, Labibni, Minsky. Essa trajetória, entretanto, não foi linear, envolvendo debates, controvérsias, revisões de posições por diferentes autores e mesmo divergências nunca sanadas.
Em seu artigo sobre o pensamento desenvolvimentista de Raúl Prebisch, Couto (2007, p. 46) afirma que:
[...] ao estudar o pensamento de Raúl Prebisch, estamos tratando da realidade brasileira do “desenvolvimentismo” após a crise dos anos 1930, chegando até os problemas da dívida externa e da hiperinflação dos anos 1980. O Brasil, sem dúvida, foi um dos principais países que sofreram a influência das idéias de Prebisch [sic]. Em razão disso, ao penetrar no pensamento do economista argentino, estamos estudando a própria Economia Brasileira e o caminho para o seu desenvolvimento (grifo nosso)
Diante de tal assertiva, parece razoável compreender mesmo de forma sucinta, para não se fugir do escopo desse trabalho, as formulações de Prebisch e, consequentemente, da CEPAL[9], antes de avançar na evolução do pensamento econômico heterodoxo brasileiro.
Conforme aponta Colistete (2001, p. 27):
A influência da CEPAL no Brasil tem sido reconhecida como provavelmente a mais significativa entre os países da América Latina durante o pós-Segunda Guerra Mundial. Embora em graus variados e muitas vezes de maneira difusa, essa influência ocorreu tanto entre intelectuais e policy-makers como entre o empresariado industrial (grifo no original).
Cabe agora compreender o porquê das teorias cepalinas ganharem apoio no Brasil não apenas entre os policy-makers[10], mas também entre os intelectuais (acadêmicos) e membros do empresariado industrial.
Os problemas do desenvolvimento, para Prebisch, estavam assentados com base em um sistema centro-periferia sendo que se buscaria por meio da industrialização, do comércio internacional e da denominada teoria da transformação, atingir como objetivo final o desenvolvimento econômico e social da periferia, em especial da América Latina (COUTO, 2007, p. 61). Esses elementos já aparecem[11] no seu documento “O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns de seus problemas principais”, que veio a se tornar conhecido como “Manifesto da CEPAL”.
De tal modo, segundo Colistete (2001, p. 23), o núcleo básico da teoria cepalina estava assentado com base em duas proposições. Com relação a primeira:
[...] as economias latino-americanas teriam desenvolvido estruturas pouco diversificadas e pouco integradas com um setor primário exportador dinâmico, mas incapaz de difundir progresso técnico para o resto da economia, de empregar produtivamente o conjunto da mão-de-obra, e de permitir o crescimento sustentado dos salários reais. Ao contrário do que pregava a doutrina do livre-comércio, esses efeitos negativos se reproduziriam ao longo do tempo na ausência de uma indústria dinâmica, entendida por Prebisch como a principal responsável pela absorção de mão-de-obra e pela geração e difusão do progresso técnico, pelo menos desde a Revolução Industrial britânica
Já a segunda proposição, continua Colistete (2001, p. 23), consiste no fato de que:
[...] o ritmo de incorporação do progresso técnico e o aumento de produtividade seriam significativamente maiores nas economias industriais (centro) do que nas economias especializadas em produtos primários (periferia), o que levaria por si só a uma diferenciação secular da renda favorável às primeiras. Além disso, os preços de exportação dos produtos primários tenderiam a apresentar uma evolução desfavorável frente à dos bens manufaturados produzidos pelos países industrializados. Como resultado, haveria uma tendência à deterioração dos termos de troca que afetaria negativamente os países latino-americanos através da transferência dos ganhos de produtividade no setor primário-exportador para os países industrializados.
Diante disso, em relação a primeira proposição apresentada, é possível auferir que a diversificação industrial seria a principal maneira de se reverter os efeitos negativos da especialização primário-exportadora, efeitos negativos estes abordados na segunda proposição e que se referem à deterioração dos termos-de-troca entre os países de centro e a periferia[12]. A “teoria cepalina está fundamentada na hipótese de que a indústria seria capaz de se tornar o núcleo gerador e difusor de progresso técnico e produtividade” (COLISTETE, 2001, p. 24) e consequentemente, levar ao desenvolvimento. Em outras palavras, a industrialização consistiria no mecanismo de se agregar valor aos termos de troca, e desse modo evitar a deterioração dos mesmos no comércio internacional e com isso o país superaria o status de periférico.
Cabe aqui um parêntese para realizar uma crítica à ortodoxia econômica, ao mainstream. Segundo a racionalidade dos mercados[13], os países que possuem vantagens com relação à determinada produção deveriam explorá-la e nela se especializar. Isso é o mesmo que eternamente condenar os países periféricos (subdesenvolvidos) a eternamente a produzir produtos de baixo valor agregado e compensar essas perdas com a importação dos países do centro (desenvolvidos). As teorias clássicas que versam sobre essa questão pressupõem situações perfeitas, a exemplo de que tudo aquilo produzido será efetivamente consumido[14], e isso não é o que ocorre em termos práticos (existe um limite do quanto se pode colocar de determinado produto no mercado). Assim, aceitar essa abordagem é o mesmo que retroceder ao século XVIII e consolidar a relação colônia-metrópole, onde o nítido ganhador é a metrópole. Independente da auto-regulação, o que está aqui em jogo é simplesmente a vida das pessoas e, como se é notório, do mundo do trabalho. Essas teorias não pressupunham, por exemplo, a modernização da agricultura (pensemos, por exemplo, nas colheitadeiras), a redução expressiva da mão-de-obra humana por esta e, consequentemente, os problemas sociais ocasionados com a migração do fluxo dessa mão-de-obra para os centros urbanos.
O núcleo básico da teoria cepalina daria origem a pelo menos duas correntes no pensamento econômico brasileiro: a teoria da dependência e a teoria do capitalismo tardio (COLISTETE, 2001, p. 27).
A teoria da dependência é creditada à Fernando Henrique Cardoso. João Manuel Cardoso de Mello pensa que a obra “Dependência e Desenvolvimento” de Cardoso e Faletto, uma das principais sobre a teoria da dependência, representa:
[...] uma tentativa de constituir uma nova problemática, a problemática da ‘instauração de um modo de produção capitalista em formações sociais que encontram na dependência seu traço histórico peculiar’, a problemática da formação e do desenvolvimento do modo de produção capitalista na América Latina. Mais que isto, traz, a meu juízo, entre outras, uma contribuição fundamental: a ideia de que a dinâmica social latino-americana é determinada, em primeira instancia, por ‘fatores internos’, e, em última instância, por ‘fatores externos’, a partir do momento em que se forma o Estado Nacional (MELLO, 1991, p. 26, grifo original).
Segundo Wolkmer (2004, p. 10), “a concepção de dependência, como referencial teórico, busca demonstrar a relação entre o subdesenvolvimento econômico e a organização sociopolítica das sociedades ditas periféricas, com os processos de dominação dos países centrais desenvolvidos”. Cabe ainda observar, conforme apontado por Wolkmer (2004, p. 11), que o paradigma da dependência compreenda além da dependência econômica externa e estrutural diferentes níveis de dependência interna (social, político e cultural).
Por sua vez, a teoria do capitalismo tardio tem como marco de sua formulação a tese de João Manuel Cardoso de Mello, que fora posteriormente transformada em livro[15]. Segundo o autor, sua tese consistiu em um “estudo do processo de desenvolvimento econômico brasileiro encarado como formação e desenvolvimento de um certo capitalismo, quer dizer, de um capitalismo que nasceu tardiamente” (MELLO, 1991, p. 175). Esse estudo, segundo apontado pelo próprio autor, consistiu em uma tentativa de revisão crítica que partiu
[...] em primeiro lugar, de estudos existentes sobre nossa histórica econômica, das visões globais, especialmente da notável Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado, às monografias específicas mais relevantes. Arrancamos, ainda, dos resultados teóricos da Economia Política da CEPAL, a mais alta criação do pensamento social latino-americano (MELLO, 1991, p. 175).
O objetivo de Mello em sua tese consistia, conforme palavras do próprio autor, em “indicar teoricamente a direção em que se poderia repensar a história econômica dos demais países latino-americanos como a história do nascimento e do desenvolvimento de capitalismos tardios” (MELLO, 1991, p. 176). Assim, segundo a teoria de João Manuel Cardoso de Mello:
[...] o capitalismo não pode formar-se sem o apoio da acumulação colonial; o capitalismo industrial valeu-se da periferia para rebaixar o custo de reprodução tanto da força de trabalho quanto dos elementos componentes do capital constante; ademais, dela se serviu quer como mercado para sua produção industrial, quer como campo de exportação de capital financeiro e, mais adiante, produtivo (MELLO, 1991, p. 177).
Diante disso, em que pese as eventuais diferenças entre as teorias abordadas, cepalina, dependência e capitalismo tardio, o que nos parece certo afirmar é que, no Brasil, o pensamento heterodoxo centrou seus esforços na questão da superação do subdesenvolvimento, ou seja, em outras palavras, em promover o desenvolvimento. Ao se promover o desenvolvimento temos a promoção a níveis maiores de renda e, consequentemente, dos recursos necessários para que o Estado possa investir em mecanismos para a promoção dos direitos fundamentais, garantindo assim, a sua universalização.
Na próxima seção veremos então como o pensamento econômico heterodoxo se relaciona com a valorização dos direitos fundamentais.
4 O PENSAMENTO ECONÔMICO HETERODOXO E A VALORIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Antes de avançar na discussão central desse trabalho, isto é, discutir a admissibilidade das políticas heterodoxas como forma de valorização dos direitos fundamentais, cabe fazer uma breve recapitulação do que foi visto até então. Na primeira seção traçamos breves considerações relacionadas ao desenvolvimento na América Latina.Já na seção anterior vimos de forma mais aprofundada o pensamento heterodoxo no Brasil, o qual foi especialmente motivado pelas teorias da CEPAL que sofreram contribuição de Raúl Prebisch, que por sua vez inspirou a teoria da dependência e do capitalismo tardio, as quais se opõem ao pensamento mainstream, também denominado ortodoxo.
Ademais vimos, tal como visto quando da abordagem sobre Prebisch, vimos que esse economista de inspiração keynesiana trabalhou na CEPAL, chegando a desenvolver aquilo que ficou conhecido como “Manifesto da CEPAL”, seu documento intitulado “O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns de seus problemas principais”. Cabe então agora uma abordagem sob ótica jurídica da concepção do desenvolvimento como meio promotor de direitos humanos fundamentais.
A Organização das Nações Unidas é um organismo internacional que surge no pós-Segunda Grande Guerra em 26 de junho de 1945 com a denominada Carta das Nações Unidas e que, além da própria Carta, possui como um dos principais marcos para o Direito Internacional dos Direitos Humanos a “Declaração Universal dos Direitos Humanos” (DUDH) de 1948, que tem em seu preâmbulo o “reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo” (ONU, 1948).
Tal como expresso em seu título, a DUDH tem caráter universal, ou seja, não se restringe a um ou outro indivíduo, mas “a todos os membros da família humana”, tal como explicitado em seu preâmbulo. Em seus artigos são estabelecidos uma espécie de patamar mínimo civilizatório, que tem a dignidade da pessoa humana enquanto princípio norteador. Isso significa que o que se estabelece na Declaração é um rol mínimo de exigências que devem ser atingidas, permitem e estimulem seus signatários irem além daquilo que está lá estabelecido.
Ao mesmo tempo, é de se notar que, posteriormente a referida Declaração, outros pactos, tratados e convenções sobre direitos humanos surgiram na esfera internacional e ampliaram ainda mais o rol de direitos humanos tutelados. É esse o caso do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966)[16] (e seus protocolos adicionais sobre procedimento de queixa e pena de morte), o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966)[17] e seu protocolo adicional que, junto da própria DUDH, formam a denominada Carta Internacional dos Direitos Humanos. Cabe ainda mencionar outros instrumentos que, embora não façam parte da referida carta, ampliaram ainda mais o rol de direitos humanos, como por exemplo, a Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio(1948)[18], a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965)[19], a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (1979)[20], aConvenção sobre os Direitos da Criança (1989)[21] e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006)[22], entre outras. Vale ainda mencionar que além do “Sistema ONU” mencionado, existem ainda outros sistemas de promoção e valorização dos direitos humanos, a exemplo do Sistema Americano cuja principal figura representativa é a Organização dos Estados Americanos (OEA).
Entre os diversos instrumentos normativos ora apresentados, o que nos é de particular interesse é o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais pois, em seus arts. 1º (item 3) e 2º (item 1 e 3), em especial, são abordados o papel do Estado em garantir para todos que nele estiverem, sem discriminação de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou qualquer outra opinião, origem nacional ou social, fortuna, nascimento, etc, os direitos econômicos referidos no pacto. Deve-se tomar um cuidado interpretativo nessa questão. O pacto em nenhum momento estabelece que é necessário seguir um pensamento ortodoxo ou heterodoxo, porém ele dá indícios do que devem seguir aqueles Estados que o ratificaram.
O reconhecimento do desenvolvimento é enquadrado dentro dessa acepção de direitos econômicos e sociais, ou em outras palavras, é o entendimento de que o desenvolvimento dos Estados contribui para a promoção dos direitos humanos. É nesse sentido que nos interessa a CEPAL, já que ela é fruto direto dessa concepção de desenvolvimento, não apenas em sua vertente econômica, mas também social e política, como forma de valorização de direitos humanos. No âmbito da CEPAL, isso foi feito ao se propor teorias de caráter genérico, mas que indicam aos Estados subdesenvolvidos (periferia), noções sobre onde e como devem focar suas políticas econômicas. Consequentemente, o que o pensamento econômico dessa instituição fez, por meio de suas teorias, é a valorização dos direitos humanos em uma concepção universalista ao entender que todos, e não apenas uma parcela da população (e aqui a interpretação pode ser tanto a parcela da população mais rica quanto os Estados desenvolvidos, o dito centro), é que tem que se beneficiar com os ganhos do desenvolvimento.
Vale ainda mencionar que nesse dispositivo legal, o denominado Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, é abordado em seu art. 6º o direito ao trabalho no item 1 e, no item 2, o que mais nos interessa para os fins desse artigo, é “garantir um desenvolvimento econômico, social e cultural constante e um pleno emprego produtivo em condições que garantam o gozo das liberdades políticas e econômicas fundamentais de cada indivíduo” (item 2). É mencionado ainda, no art. 7º, o direito a condições de trabalho justas e favoráveis que assegurem remuneração mínima, salário equitativo, condições de trabalho para as mulheres não inferiores às dos homens, condições de trabalho seguras e higiênicas, repouso, lazer, limitação razoável das horas de trabalho, férias periódicas. No art. 8º é mencionada a liberdade para formação de sindicatos, no art. 9º é abordada a seguridade social.
O que temos aí é uma nítida mensagem a sociedade internacional. Mensagem essa que foi acatada quando do desenvolvimento do Sistema Bretton Woods, o qual buscou consolidar essas questões. Um dos principais responsáveis pela elaboração de tal ordenamento benéfico à valorização dos direitos humanos ora mencionados foi sir John Maynard Keynes. Cabe ressalvar que Keynes não foi o único que teve suas ideias acatadas quando da Conferência de Bretton Woods, a exemplo de Harry Dexter White, norte-americano creditado como arquiteto do hoje denominado Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional.
No entanto, tal ordenamento benéfico foi aos poucos corroído e desmantelado pelo capital por meio de políticas de desregulamentação e liberalização.
Conforme aponta Chesnais (1996, p. 25):
[...] para os turiferários da globalização, a necessária adaptação pressupõe que a liberalização e a desregulamentação sejam levadas a cabo, que as empresas tenham absoluta liberdade de movimentos e que todos os campos da vida social, sem exceção, sejam submetidos à valorização do capital privado.
Tais medidas promovidas por meio do discurso político neoliberal durante os anos 80, deram fomento a um novo ordenamento, popularmente conhecido como globalização, também denominado, mundialização conforme as escolas francesas (SILVA; MISAILIDIS, 2016, p. 143).
Inobstante, é necessário ter em mente que:
Se antes a regulamentação, promotora do pleno-emprego e do estado de bem-estar social, com suas benesses consolidadas por meio do Sistema Bretton Woods, serviu aos interesses dos detentores do capital que precisavam naquele período reconstruir e criar mercados devastados pela guerra (a exemplo da Europa e do Japão), agora esse ordenamento já não seria mais de serventia. O advento do Euromercado, a crise do petróleo, o choque dos juros promovidos por Paul Volcker, levariam a um frenesi nos mercados financeiros que resultaria na mudança de ritmo e direção do processo de reprodução social. (SILVA; MISAILIDIS, 2016, p. 143)
E, de tal sorte, é possível afirmar que:
A tal da globalização criou uma acepção de estado de exceção permanente por meio de suas ações de desregulamentação e liberalização. As normas que foram afastadas com o ideal neoliberal se tratam dos direitos fundamentais, conquistados às duras penas, tendo necessitado de duas grandes guerras em um breve século XX, para serem reconhecidos pela sociedade internacional. E agora, nesse momento, chegam ortodoxos neoclássicos/neoliberais que querem nos fazer crer por meio de seu discurso de racionalidade dos mercados de que é necessário reduzir e acabar com direitos, especialmente os trabalhistas e os demais direitos sociais, como a previdência, para que os países possam competir em maior igualdade no mercado internacional, ou seja, querem que os direitos passem a ser vistos como custos e assim serem eliminados para que possa extrair o máximo de valor[23] possível, uma lógica de fácil compreensão, mas muito perigosa para o avanço da espécie humana já que coloca o homem meramente como instrumento de manipulação do capital. (SILVA; MISAILIDIS, 2016, p. 143)
No Brasil, é possível verificar a partir de análise da Constituição Federal (BRASIL, 1988), que os direitos fundamentais consistem no rol de direitos previstos, em sua maioria, ou seja, não exclusivamente, no título II (“Dos Direitos e Garantias Fundamentais”). O constituinte subdividiu os referidos direitos nos seguintes capítulos: “Dos direitos e deveres individuais e coletivos” (capítulo 1, art. 5º); “Dos direitos sociais” (capítulo II, arts. 6º-11); “Da nacionalidade” (capítulo III, arts. 12 e 13); “Dos direitos políticos” (capítulo IV, arts. 14-16) e; “Dos partidos políticos” (capítulo V, art. 17).
Além dos direitos expressamente dispostos na Carta Magna, em decorrência da Emenda Constitucional n. 45 de 30 de dezembro de 2004, cabe observar o efeito da inclusão do § 3º no art. 5º, o qual versa “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”, ou seja, a partir de então, os tratados e convenções de direitos humanos que forem aprovados os requisitos estipulados passaram a ganhar o status de direitos fundamentais uma vez que se equivaleriam a Emenda Constitucional e, consequentemente, ganham o status de norma constitucional. E assim, uma vez na condição de direitos fundamentais, são passíveis de reinvindicações no cenário judicial.
Além dos direitos fundamentais, existem também os preceitos fundamentais, os quais se constituem, conforme a própria redação constitucional disposta no art. 3º, caput, nos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Dentre esses objetivos fundamentais incluem-se a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (inciso I), garantir o desenvolvimento nacional (inciso II), erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais (inciso III), e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (inciso IV).
A atual Constituição Federal não pode, obviamente, ser compreendida fora de seu contexto histórico-social. A sua elaboração ocorreu não apenas após um longo período de crise econômica, lembrando que a década de 80 é popularmente conhecida como “a década perdida”, caracterizada por um cenário de elevada inflação e problemas sociais relacionados, como também tendo em vista o processo de reabertura democrática já que de 1964 à 1979 o país foi governado por militares em um regime ditatorial. Vale ainda observar que a constituição anterior, vigente durante o período da ditadura, também era dotada de direitos fundamentais, mas dado a razão de Estado vigente eles foram sumariamente massacrados pelas ações do DOI-CODI, os quais empregavam métodos de tortura barbáricos, como exemplo do popularmente conhecido “pau de arara”[24]. Assim, é certo afirmar que no Brasil, os direitos fundamentais conquistados pela Constituição de 1988 são frutos de um intenso processo de conquistas.
Vemos que a preocupação pela promoção do desenvolvimento, e não do mero crescimento, se torna fundamental para se atingir os objetivos fundamentais de nossa constituição, a qual reflete diretamente aquilo que se espera de nosso país enquanto Estado Democrático de Direito. E assim sendo, o crescimento econômico pelo crescimento econômico é algo sem sentido e perverso. O crescimento econômico deve ser capaz de levar ao desenvolvimento e, desenvolvimento esse não apenas econômico, mas social e cultural. É por conta disso que a heterodoxia, diferente da ortodoxia, merece destaque. A preocupação das escolas marxistas, keynesiana, pós-keynesianas (destacando no caso a cepalina por dela ter sido inspirado no Brasil as teorias da dependência e do capitalismo tardio), dentre outras heterodoxas, sempre foi a de melhorar as condições dos indivíduos a partir do tratamento do crescimento econômico enquanto meio para se atingir o desenvolvimento. Assim, é certo afirmar que a heterodoxia consiste em uma forma de pensar cuja real preocupação são as pessoas e não a mera valorização do capital, tal como fazem os ortodoxos.
Diante disso, é possível afirmar que a heterodoxia busca não apenas deixar os direitos fundamentais enquanto um mero pedaço de papel, mas garantir que esse ideal se materialize no mundo real. Nesse sentido, podemos afirmar que pensamento econômico desenvolvimentista busca valorizar a condição do ser humano para que o mesmo alcance uma condição minimamente digna; ou seja, é um pensamento de viés humanista, e isso vai necessariamente contra os interesses dos credores do Estado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Opensamento econômico heterodoxo trouxe consigo o viés de se preocupar com a questão do desenvolvimento. Crescimento e desenvolvimento são termos totalmente distintos. O crescimento econômico é um meio para se atingir o desenvolvimento enquanto finalidade. Consequentemente, vimos que a promoção do desenvolvimento é um meio para a valorização dos direitos fundamentais. Ao promover o desenvolvimento o Estado aumenta os níveis de renda interna e, com esse aumento de renda, é capaz de promover investimentos que levem a promoção dos direitos fundamentais como educação, saúde, segurança, dentre outros, os quais são elementos cruciais para que os indivíduos possam atingir uma vida digna dentro da sociedade.
A preocupação do pensamento econômico heterodoxo são os indivíduos da sociedade, e não a mera valorização do capital. Medidas neoliberais, como as adotadas pelo governo Temer, até podem gerar empregos e crescimento econômico, mas o que o se deve ter em mente para fins de orientação e tomadas de decisão são quais os custos e impactos de sua adoção, que como vimos na seção 4, pesquisadores do Fundo Monetário Internacional parecem reconhecer. Não se trata de mera geração de emprego, mas da qualidade do emprego gerado, que é algo que os turiferários da globalização parecem não se importar já que, para eles, basta trabalhar, ainda que não seja um trabalho digno.
Passado um ano de governo interino, vemos no Brasil contemporâneo uma fragilização de direitos conquistados à duras penas, como são os casos da reforma trabalhista e da previdência, que podem ser aprovadas nesse ano de 2017, e ainda a recém aprovada Emenda Constitucional 95/2016, que já se aplica nesse de 2017, e que possui previsão de validade dentro do ordenamento jurídico por período de ao menos 20 anos. Tais medidas atendem ao ideário neoliberal, e devem ser questionadas sobre a sua real eficácia, pois ao que indica, não são medidas que prometem levar o país ao desenvolvimento, mas tão somente resolver um suposto problema de caráter financeiro; e aqui dizemos suposto porque mesmo a sua situação de emergência financeira, que justificaria tais ações, são passíveis de discussão, em especial no âmbito acadêmico onde é da pluralidade de ideias e do debate delas decorrente que novas perspectivas de mudança podem surgir.
Diante do conteúdo ora discorrido, é possível afirmar que o presente artigo conseguiu atingir com o seu principal objetivo: o de contribuir com o fomento da ciência jurídica em âmbito acadêmico por meio de diálogo transdisciplinar especialmente entre o Direito e a Economia.
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* À época da submissão, mestrando do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) e bolsista CAPES/PROSUP. Bacharel em Relações Internacionais (2013) pelas Faculdades de Campinas (FACAMP).E-mail: arrudaesilvamf@gmail.com.
** Professora do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). Doutora em Direito das Relações Sociais (1999) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). E-mail: mglmanzo@unimep.br.
[1]Aprofundaremos essa questão na seção 2 desse artigo.
[2] Para fins reflexivos, segundo dados do IBGE com base em levantamento do ano de 2015, a expectativa média de vida do brasileiro ao nascer é, atualmente, de 75,5 anos, sendo que, para os homens, tal expectativa é de 71,9 anos e, para as mulheres, 79,1 anos. Contudo, tal situação não é válida para todos os Estado, como no Maranhão e Piauí, vez que neles a expectativa de vida média de vida é de 70,3 e 70,9 anos respectivamente, sendo que para os homens a referida expectativa é na casa dos 66 anos (IBGE, 2016, p. 13). Podemos então afirmar que, se aprovada, tal reforma resultaria em um ato de crueldade descabido àqueles que mais dependem e se encontram em situação de vulnerabilidade, algo que os defensores de tal reforma parecem ser cegos a enxergar. Porém, de forma inabalável, esses defensores estão convictos de que a sociedade deva aceitar todo tipo de ônus em prol das contas públicas, afinal teria sido ela própria a causadora desse problema.
[3]A quem entenda, especialmente no âmbito econômico, que esse pode não ser o melhor caminho. É nesse sentido que se posiciona Silva (2010). Segundo Silva (2010, p. 5): “O pensamento econômico no Brasil e as interpretações da realidade ali feitas têm como condicionante fundamental o lugar social na qual se encontra quem interpreta a realidade e forma o pensamento: os que se ajustam dentro do bloco de poder, e qual função exercem neste, ou fora dele, desempenhando atribuições contra-culturais. Deste modo, conhecer as teorias formuladas (e em formulação) no Brasil, tipificando-as, é insuficiente, tanto para entender a realidade que a teoria se propõe a explicar – isto é, uma questão de método, quanto o desenvolvimento real da formação econômico-social brasileira”. No entanto, também entendemos que determinadas áreas do conhecimento são carentes de uma abordagem ainda que simples e introdutória, justamente porque um primeiro contato pode ser aquilo que pode vir a fomentar trabalhos futuros sobre um determinado tema.
[4] Termo em inglês que, em tradução livre, pode ser compreendido como “queda”.
[5] Grande Guerra é uma referência ao termo empregado pelo historiador Eric Hobsbawn, a qual consiste em uma crítica à terminologia guerra mundial.
[6] A exemplo da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 no âmbito da ONU e dos tratados e convenções subsequentes. Essa questão será retomada no tópico 4 “O pensamento econômico heterodoxo e a valorização dos direitos fundamentais”.
[7]Conforme explica Couto (2007, p. 45), Raúl Prebisch (1901-1986) foi um economista argentino indicado por Gunnar Myrdal ao primeiro Prêmio Nobel de Economia em decorrência de sua trajetória no Banco Central da Argentina e atuação internacional por meio da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL), e na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento e Comércio (UNCTAD).
[8] Para maiores informações sobre a relação de Raúl Prebisch com a CEPAL confira: CEPAL. RaúlPrebisch e a CEPAL. Disponível em < prebisch.cepal.org/pt-pt/Raul-prebisch-e-cepal>. Acesso em 21. Abr. 2016.
[9] Em linhas gerais, as preposições teóricas cepalinas “propunham que a industrialização apoiada pela ação do Estado seria a forma básica de superação do sub-desenvolvimento latino-americano” (COLISTETE, 2001, p. 21). Em outras palavras, o que temos aqui é o interesse pela ação do Estado, a sua intervenção direta na economia, como forma de levar ao desenvolvimento. Essa propositura, claro, é contra o ideal ortodoxo, da mão-invisível, do auto-ajuste/auto-regulação.
[10] Em tradução livre, formadores de políticas públicas; em outras palavras, os governantes e aqueles que os assessoram. Oportuno observar que, dentre esses policy-makers, um em particular nos merece especial atenção: Celso Furtado, porque “não apenas participou da teoria do desenvolvimento na América Latina como também teve atuação destacada como policymaker diretamente ligado ao executivo e formulador de planos de desenvolvimento quando ligado à CEPAL (BASTOS; D’ÁVILLA, 2009, p. 181). Infelizmente, “sua carreira como policymaker foi interrompioda pelo golpe militar de 1964, mas sua produção acadêmica [felizmente] continuou até a morte” (BASTOS; D’ÁVILLA, 2009, p. 176).
[11] Para maiores informações Cf. PREBISCH, R. O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns de seus problemas principais. Disponível em < http://archivo.cepal.org/pdfs/cdPrebisch/003.pdf >. Acesso em 21 Abr. 2016.
[12]Termos de troca são os bens que seriam postos no comércio internacional. Por sua vez, a questão da deterioração dos termos-de-troca mencionada por Prebisch significa que os bens produzidos pelos países da periferia (subdesenvolvidos) já entrariam em condição de desigualdade no comércio internacional em relação aos países do centro (desenvolvidos) porque o valor a eles atribuído seria baixo. Assim, por serem dotados de baixo valor, seria necessário um volume alto de exportação e, consequentemente, um consumo compatível no país de destino, para que tais produtos compensem os produtos de maior valor agregado que são importados. Uma maneira de ilustrar essa questão é quando pensamos na exportação de um bem em estado bruto como, por exemplo, o café ou a soja, e, ao mesmo tempo, o país importa produtos industrializados derivados dessas matérias primas. Nessa situação, o produto foi processado no exterior, passou pelo processo de industrialização, e teve agregação de valor conforme as diferentes etapas da cadeia produtiva. Nesse sentido, ao vender o bem de maior valor agregado, o país que o exportou necessitou vender menos em unidades do que aquele que exportou a matéria prima em estado bruto. No entanto, cabe observar que esse exemplo retratado envolveu itens simples, mas existem bens de alto valor, como componentes de computador e outros bens de capital que exigiriam, por sua vez, uma exportação massiva dos bens de menor valor para que o valor dos mesmos possa ser compensado no comércio internacional. Por fim, vale ainda para melhor compreender essa questão de agregação de valor, consultar o volume 1 do Capital de Marx (2013) a respeito da formulação de valor, valor de uso e valor de troca, para, consequentemente, compreender o processo de agregação de valor.
[13]Racionalidade dos mercados é umtermo que surge a partir do artigo de Muth (Cf. 1961), que segue viés econômico ortodoxo, de que os mercados agem de forma racional.
[14] Ou em termos mais em sintonia com a economia, oferta agregada (OA) é igual a demanda agregada (DA), o que pode ser expresso matematicamente como OA=DA.
[15] Para fins de aprofundamento, cf. Mello (1991) no prefácio escrito por Belluzzo.
[16]Promulgado no Brasil por meio do Decreto n. 592, de 6 de julho de 1992.
[17]Promulgado no Brasil por meio do Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992.
[18]Promulgado no Brasil por meio do Decreto n. 30.822, de 6 de maio de 1952.
[19]Promulgado no Brasil por meio do Decreto n. 65.810, de 8 de dezembro de 1969.
[20]Promulgado no Brasil na íntegra por meio do Decreto n. 4.377, de 13 de setembro de 2002.
[21]Promulgado no Brasil por meio do Decreto n. 99.710, de 21 de novembro de 1990.
[22]Promulgado no Brasil por meio do Decreto n. 30.822, de 6 de maio de 1952.
[23] Para melhor compreender o processo de extração de valor nas economias capitalistas, é sugerido ao leitor consultar Marx (2013) sobre a formação da acepção de valor nas mercadorias e a denominada extração da mais-valia em suas formas absoluta e relativa.
[24]Técnica em que a pessoa tem os seus punhos e joelhos amarrados em uma barra apoiada e o corpo posicionado para baixo podendo, a partir disso, ser utilizado outras formas de tortura complementares.